Badsista une influências e vivências em “Gueto Elegance” 

25/05/2023

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Hanier Ferrer

Por: Hanier Ferrer

Fotos: Karoline Leal/ Divulgação

25/05/2023

Em seu primeiro álbum, “Gueto Elegance” (2021), Badsista passeia por diversas influências que atravessam a sua trajetória – do início no rock até se tornar um nome consolidado na cena de música eletrônica nacional e global. Algo que fica claro não só na escuta, mas na construção do show do disco, onde a produtora musical traz uma onda que bate forte na estética sonora, audiovisual e cenográfica, ou seja, nada está ali por acaso.

Como ela mesma já falou em outros momentos, a parada está na maneira de cozinhar a música, e às vezes, nesse processo, se torna necessário voltar ao início e preparar cada ingrediente novamente. No universo de experimentações proposto a cada apresentação, o disco se renova no palco com a participação de Vênus Garland e Malka Julieta. O encontro define um status: o de popular, sem deixar de ser refinado. 

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Pela projeção que a Badsista alcançou, fica fácil perceber que o disco carrega uma provocação: “Sejamos quem a gente tá a fim de ser e foda-se”. A obra traz sons que abrem espaço para relacionar a artistas como Princess Nokia, ABRA, Luísa e Os Alquimistas, Silva (no início de carreira), Red Lion, KBrum, Nação Zumbi, The Blaze, entre outros. O gueto é riquíssimo, e se ainda restava alguma dúvida, com a obra de Badsista, quem afirmar que não pegou a mensagem está sendo desonesto, no mínimo.

Nesse baú cheio de tesouros, a produtora, compositora e cantora te leva pela mão num rolé que possui uma mistura do sound system de baile tipo o More Fya Club do Emcee Le, em Osasco, o Baile da DZ7, na Paraisópolis, na festa Mamba Negra, em algum galpão do Brás ou, em qualquer bar fuleiro de hardcore, daqueles bem quentes e apertados. E, o mais importante, como diz Jup do Bairro: “Alguém avisa, tô pagando a vista”, independente de números, a parada é a grana chegar no bolso de todes artistes.

Seja qual for o formato: em casa ou no show, algo que é presente na entrega que a artista faz é propor um sentimento de suspense em cada faixa, hora trazendo rimas, hora deixando o beat falar por si só. No meio disso tudo é incrível como alguns momentos de suspensão surgem para ampliar ainda mais a expectativa das histórias que vão sendo apresentadas. Como num salto no espaço-tempo, somos transportados pro Rio de Janeiro na faixa que sempre faz todos cantarem bem alto: “Essa é da boa, da braba do Jaca! Só dois tapa, tu já fica embrazada!”. 

E ainda assim, tudo faz sentido, pois mudanças fazem parte da identidade da Badsista. Você pode viajar em uma marola sci-fi ou mais realista, não importa onde você estiver, “Gueto Elegance” te recebe muito bem. Não tem espaço para travas, receios e inseguranças. Cada faixa te puxa para conhecer universos que se complementam e que fazem parte de quem a produtora é, mas tudo isso sem forçar a barra. A música possui um papel quase divino, nada é mais importante, mas se parecer, pode esquecer: “VSNF” (vê se não fode). 

Aqui, fica explícito o quanto o gueto traz muita elegância, brilho, finesse, enfim, qualquer sinônimo que caiba para definir como os sons criados por pessoas das inúmeras periferias do Brasil – e do mundo – são impecáveis nas suas entregas. Vale citar especialmente os solos de bateria de Vênus Garland no show: dá pra afirmar com tranquilidade, que a gata entrega tudo e mais um pouco. No show que rolou na Casa Natura Musical em 15 de abril, por exemplo, os seus solos foram tão emocionantes quanto os de Richard Bailey, da banda Cymande, que se apresentou na mesma semana, em São Paulo.

O “Gueto Elegance” é um atestado de que estereotipar uma pessoa, como forma de mascarar opressão social, só serve para propagar atraso, preconceito e uma visão limitada da arte, da vida e do significa nasceu no Brasil. Especialmente, considerando o ciclo de exploração que o território viveu ao longo dos anos de colonialismo, imperialismo e agora, o “pós-tudo”. 

Dá pra enxergar a vivência, dá pra sentir a onda e dá pra sacar o papo, não é um disco para ser saboreado com pressa, é pra deixar rolar e curtir, uma, duas, três, quantas vezes quiser. Ser de periferia é ser múltiplo e não há nada que mude isso, quem acredita que as pessoas precisam ser uma coisa só que ature o baile e o papo reto da Badsista.

Tudo nosso, nada deles… Depois de nóiz, é nóiz de novo!

E o que podemos esperar? O que será que vem pela frente? Depois de um turbilhão de tweets elogiando “Gueto Elegance” e até pedidos de justiça no Grammy, a expectativa para descobrir qual será a evolução desse pokémon, criado com muito cuidado e dedicação por Badsista, é grande. Mas, tentar adivinhar também é perda de tempo, é muito mais interessante aproveitar as próximas grandes apresentações que ela fará, como por exemplo, no b2b com a relíquia do techno, Ellen Allien, no festival The Town.

Seja como DJ, produtora musical, cantora, compositora ou instrumentista, Badsista entrega uma experiência diferenciada, e isso faz com que exista uma alta expectativa no que ela vai apresentar nas pistas e palcos. Afinal, a criatividade dela vai longe e pode, no meio de tudo acontecendo ao mesmo tempo, simplesmente mudar, porque sim, porque ela entende que vale a pena misturar estilos que poderiam ser entendidos como distantes. 

Tudo isso acontece por conta da sua caminhada. Sem dúvida, o seu repertório passa por elementos pessoais, mas que tocam os ouvidos e corações de muita gente. Ou seja, as combinações são infinitas e Badsista dosa qual funciona melhor para o seu apetite e para o dos fãs. É dessa busca que nascem as obras-primas do álbum, e é nela, que o gueto se mostra muito elegante, mesmo quando dizem que ele não é. Elegância também é sinônimo de gueto, e vice-versa, pode botar no dicionário. 

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25/05/2023

Hanier Ferrer

Hanier Ferrer