O surgimento do Garbage foi decisivo para a sonoridade do mainstream do rock dos anos 90. Formada por Shirley Manson (vocal), Steve Marker (baixo), Duke Erikson (guitarra) e Butch Vig (bateria), a banda teve um papel pioneiro ao unir o uso de beats, loops e samples à estética do rock pós-grunge.
Butch Vig foi um dos maiores responsáveis por isso. Desde os anos 80, ele já trabalhava produzindo discos e, em 1991, produziu dois dos álbuns mais importantes já feitos na história do rock, o Gish, disco de estreia do The Smashing Pumpkins, e o lendário Nevermind, do Nirvana. Mas em 1993, quando formou o Garbage, Butch já não aguentava mais nada disso.
Em uma conversa franca com a NOIZE, Vig conta que estava saturado da sonoridade do rock quando mergulhou no universo dos samples e loops, e que foi impregnado desse sentimento que o Garbage nasceu. Também conversamos sobre seu estado de saúde, que lhe impediu de terminar uma turnê em 2016.
Recentemente, a banda relançou o seu segundo disco, Version 2.0., em uma edição comemorativa que celebra os 20 anos do álbum e inclui dez faixas extras gravadas à época. Agora, eles se preparam para começar uma extensa turnê que reviverá as faixas desse clássico. Segundo Butch, eles estão tentando trazer ela ao Brasil em novembro, mas por enquanto nada está garantido.
Confira abaixo nosso papo.
Como nasceu o Garbage?
Bem, nós começamos o Garbage fazendo remixes, Duke [Erikson], Steve [Marker] e eu. Fizemos vários remixes de Depeche Mode, Nine Inch Nails, U2, e aquilo nos inspirou a começar uma banda. Vimos a Shirley [Manson] na MTV com a banda dela, Angelfish, e nós pedimos a ela que cantasse algumas canções e, logo depois disso, ela entrou na banda de cabeça. Hoje, já estamos juntos há mais de 20 anos. É meio louco.
Você já disse que o Garbage começou como um experimento, o que vocês estavam buscando na época?
Eu, pessoalmente, estava entediado de gravar músicas de rock porque eu já tinha feito muitos discos com guitarra-baixo-bateria. Quando o Nirvana e Smashing Pumpkins começaram, eu já tinha gravado mil bandas de punk rock e estava começando a ficar cansado daquilo. Então comecei a usar samplers, comprei um Kurzweii e um Akai S1000, e eu estava ouvindo discos de artistas como Public Enemy, que pra mim soam muito interessantes, eu estava interessado em como eles faziam o som daqueles discos. Então, pra mim, o Garbage começou como uma experiência porque eu queria me livrar das gravações tradicionais de estúdio.
E, naquele momento, não havia muitas bandas no mainstream fazendo isso, correto?
É, nós fomos uma das primeiras bandas de rock a levar um sampler pro estúdio e trazer beats de hip hop, de música eletrônica, pra juntar com guitarras ruidosas e melodias pop melancólicas. Muitas bandas conseguem fazer isso hoje porque a tecnologia mudou muito, mas, naquela época, muita gente ficou bem surpresa conosco.
E quais eram as suas expectativas sobre a banda?
Eu não tinha nenhuma expectativa sobre o Garbage, inclusive eu nem queria sair em turnê, achava que a gente só ia lançar o disco. Eu estava trabalhando full-time como produtor [de outras bandas] e precisava voltar pro estúdio. Mas o disco de estreia decolou, começaram a tocá-lo em várias rádios e aí a turnê curta que faríamos se transformou em uma turnê de um ano e meio e acabamos vendendo milhões de discos. Isso nos deixou completamente chocados, nenhum de nós tinha a menor ideia de que o disco ia decolar. Na primeira turnê, tocamos em festivais grandes como Roskilde e o Reading and Leeds Festival para 50 mil pessoas, 80 mil pessoas, e vimos uma resposta incrível às canções do disco. Foi a primeira vez em que nós percebemos que realmente tínhamos conseguido um público grande.
O que estava na cabeça de vocês quando fizeram o segundo disco, Version 2.0.?
Quando começamos o Version 2.0. percebemos que tínhamos uma grande oportunidade, já tínhamos uma grande base de fãs e estávamos no nosso momento. Então, elevamos nossos padrões lá no alto, queríamos fazer um disco muito técnico, mas também ter muito swag. Eu acho que aquele disco tem o som de uma banda crescendo, nós estávamos indo adiante.
Como você avalia esse disco em relação à discografia do Garbage?
Acho que, de certa forma, pode ser o nosso melhor álbum porque ele realmente define como é o nosso som exatamente. Além de toda produção técnica que nós trouxemos para o disco, nós realmente quisemos colocar canções que tivessem uma sonoridade forte e letras que ressoassem nas pessoas. Temos grandes músicas em todos os nossos discos, mas Version 2.0., coletivamente, é provavelmente o mais forte que fizemos.
Vocês estão prestes a entrar em turnê com ele novamente, como se sentem tocando essas faixas de novo?
Acho que vai ser muito divertido porque vamos tocar todas as músicas do disco e não fazemos isso desde a turnê do Version 2.0.. Incluímos vários B-Sides na nova edição do disco e, na turnê, vamos tocar a maioria dessas músicas também. Para nós, vai ser divertido voltar e refazê-las, tenho certeza de que algumas delas serão rearranjadas com uma abordagem mais moderna que pode deixar algumas canções mais interessantes para nós. Mas acho que, para um fã clássico de Garbage, que esteve conosco há tanto tempo com esse disco, esse show vai ser uma viagem.
Vocês tem planos de vir ao Brasil?
Estamos tentando, nós adoraríamos ir ao Brasil, Argentina, Chile, Peru… Todas as vezes em que estivemos aí foram experiências incríveis. Nós não sabemos se vamos conseguir ainda, mas vamos manter os dedos cruzados para que estejamos na América do Sul em novembro.
Não é fácil manter uma banda viva por 20 anos, como vocês fizeram isso?
Nós temos muita sorte de nos dar bem enquanto amigos, tem um laço de comunhão entre nós. Eu trabalhei como produtor com muitas bandas que eram completamente disfuncionais, que não se davam bem, e essas bandas não costumam durar. Eu acho que essa é a razão pela qual nós ainda estamos aqui 20 anos depois, nós gostamos de trabalhar juntos. Ainda que às vezes seja muito difícil porque todos nós temos opiniões diferentes sobre o que deveríamos fazer. Mas acho que o Garbage tem sido um grande canal criativo para nós quatro e continua sendo, isso manteve a banda ativa.
Em 2016, quando vocês estavam lançando Strange Little Birds, você teve um problema grave de saúde. O que houve?
Comecei a ter alguns problemas sérios com infecções nos sinos, sinusites. Por causa dos problemas nos meus ouvidos, tive que tomar vários antibióticos enquanto estava viajando com a banda. Demorou um bom tempo até que eu retomasse o controle, eu me sinto ótimo agora, mas na época eu estava bem assustado. Porque eu uso meus ouvidos para trabalhar, pra tudo que eu faço. E as condições dos meus sinos estavam causando tantos problemas para as minhas orelhas que eu tive que parar de fazer turnês por um tempo.
E está curado?
Sim, eu fiz uma série de shows com a banda no último verão, fiz uma turnê na América do Norte e foi muito divertido. Começamos os ensaios em agosto e estamos ansiosos para a turnê do Version 2.0., acho que vai ser incrível.
E sobre o futuro do Garbage, vem um disco novo por aí, correto?
Sim, estamos gravando novas ideias de músicas para um outro disco. E estamos muito felizes, temos muitas ideias boas, estamos muito animados com isso. Nós provavelmente não vamos ter chance de finalizar isso até o final do ano, início de janeiro, mas esperamos lançar um disco novo no início do ano que vem.