Forjada nas ruas, o Bloco da Laje carrega na pele as lembranças das primaveras, dos verões, dos outonos e dos invernos de Porto Alegre. Com os pés inquietos de quem caminha por calçadas, paralelepípedos e gramas da cidade, o coletivo conhecido e reconhecido por comandar o carnaval de rua da capital do Rio Grande do Sul agora dá um passo marcante na carreira como banda: o lançamento de “O que tu tem cidadão”, primeiro clipe do álbum visual Bloco da Laje 4 Estações.
Com direção de Julia Rodrigues e Antônio Ternura, o ator Zé da Terreira incorpora o cidadão que vaga pelas ruas de Porto Alegre. “O que tu tem cidadão” é faixa dedicada ao outono e conta com a parceria da francisco, el hombre. O vídeo vem ao mundo primeiro aqui; assista abaixo com exclusividade:
O álbum visual contará com quatro clipes independentes, mas correlacionados. Para sentir a temperatura do projeto, batemos um papo com Julia Rodrigues e Juliano Barros, diretores artísticos do Bloco da Laje ao lado de Diego Machado. Leia na sequência!
Como tem sido essa fase do coletivo que tem uma formação de bloco de rua se transformando em banda de uma forma, digamos, mais oficial?
Juliano: Todo esse desenho de banda, formato show, só foi possível depois de muita experimentação na rua. O contato direto com as pessoas e o espaço de encontro. Estimulados por convites para apresentações em lugares fechados, foi aí que começou a se desenrolar o desejo de dar um direcionamento artístico em um formato adaptado para o palco, mantendo a vibração e energia que construímos na rua. É como levar a rua para o palco.
Julia: O formato reduzido do bloco em forma de banda foi um desejo que nos acompanhou por muitos anos antes de se realizar, motivado por diversos convites para apresentações em espaços fechados e/ou palcos. Em 2016 fizemos nossa primeira apresentação como banda, em evento num palco ao ar livre, montado no Largo Glênio Peres. Um marco significativo pro grupo que se realiza e luta pela ocupação e manutenção dos espaços públicos. Desde então desenvolvemos esse formato e participamos de festivais como Morrostock e Psicodália, realizamos shows em grandes palcos e casas de show consagradas, sempre contando com grande aderência do público, que vem do nosso carnaval na rua. O Projeto Natura Musical é importantíssimo nesse caminho. Através dele registramos e ampliamos nosso trabalho e afirmamos nossa multiplicidade enquanto coletivo, bloco e banda, pois um formato fortalece e fomenta o outro.
Por que vocês decidiram investir em um álbum visual?
Julia: O álbum visual vem com o intuito de gerarmos uma obra que registre nossa caminhada até aqui, que desenvolva e mostre a nossa estética, que está relacionada com nossa visão de mundo e dos momentos históricos que construímos e vivenciamos. É também um material que relaciona diversas linguagens, como o audiovisual, a música e as artes plásticas, bem como revela nossa diversidade de formatos: desde a banda – hoje com 21 integrantes – até imagens do bloco de rua com um corpo de quase 200 integrantes e milhares de foliões. O álbum visual gera um material transmídia, tanto como clipes que podem ser vistos separadamente quanto um filme que visto na íntegra pretende dar um panorama poético do trabalho do Bloco durante o ano inteiro, por isso “As quatro estações”.
Juliano: Há alguns anos que viemos investindo em projetos culturais, para isso foi importante a criação de um núcleo de produção. Em 2013, fomos contemplados com o projeto do FAC [Fundo de Apoio à Cultura, do estado do Rio Grande do Sul] para a realização de dois cortejos. Tocamos na memória de dois pontos importantes da cidade: a Colônia Africana e o Areal da Baronesa. No Areal estabeleceu-se uma troca com o Areal do futuro. Tocamos na memória imaterial desses espaços. O projeto de um álbum visual vem junto com o desejo de gravar as nossas músicas autorais, de deixar registrado o que viemos produzindo ao longo desses oito anos. A parceria com a [produtora] Marquise 51 também foi um acréscimo na descoberta de alguns caminhos.
Com tem sido revisitar a cidade de Porto Alegre através do projeto Quatro estações? Como vocês, enquanto Bloco, se relacionam com a cidade?
Juliano: Desenvolvemos um carinho muito grande pela cidade de Porto Alegre. Acreditamos na troca, no convívio, na experiência dos afetos e encontros presenciais. Nosso diálogo com a cidade sempre foi de estar em busca de espaços públicos, seja para os ensaios do bloco ou mesmo para celebrar um aniversário. Buscamos ver as praças e parques da cidade como lugar de convívio e troca. Já percorremos centro, zona sul e zona norte. Aqui, nessa Porto Alegre, vivemos o verão, o outono, a primavera e o inverno. A relação com a cidade é a grande pérola do Bloco da Laje. Hoje a preparação para nossa saída está no imaginário do calendário cultural da cidade. Bem como o ponto alto que é a nossa saída no pré-carnaval. É uma multidão colorida que vibra e gera amor por onde passa.
Julia: Destaco também a arquitetura da cidade como um palco pras nossas intervenções artísticas, trazendo o nosso olhar, presença e atenção sempre para a história dos locais onde passamos e sua ressignificação através da alegria e da arte.