Com mais de sete milhões de ouvintes mensais no Spotify, o cearense Matheus Brasileiro Aguiar, o Matuê, hoje com trinta anos, pode ser considerado um dos músicos de maior sucesso do Brasil. Emplacando hits no trap desde 2017, o artista se tornou conhecido pelo seu flow melódico, carregado de autotune, com letras que falam sobre um estilo de vida cheio de dinheiro, sucesso, curtição, sexo e maconha.
Em 2020, lançou seu primeiro álbum, Máquina do Tempo, pela sua própria gravadora, 30PRAUM, da qual também é diretor artístico. Além de gravar e lançar outros artistas do trap, como Teto e WIU, a empresa também tem uma marca de roupas e toca o Plantão Festival, que, em sua edição, nos dias 19 e 20 de abril de 2024, em Fortaleza, contará com Veigh, Derek, ConeCrew e outros nomes. A venda de ingressos abre no dia 13 de dezembro.
Com sucessos como “Quer Voar” e “Conexões de Máfia” (em parceria com Rich The Kid), Matuê está preparando um novo trabalho e promete chegar com novas sonoridades, explorando outros gêneros além do trap e abordando temas que ainda não apareceram em sua obra. 333 nem foi lançado e já está dando o que falar no mundo do rap. Abaixo, você pode conferir a ideia que trocamos com o artista sobre o que vem por aí na sua carreira.
Cara, quero começar perguntando como é para ti isso de ser um dos artistas mais populares do Brasil. Como é que tu enxerga essa questão e lida com isso?
É bom, né, mano? Sucesso é incrível no sentido de expandir o nosso trabalho. Dá ferramentas e capital para a gente poder executar o nosso projeto e tal. Então, eu vejo mais para esse lado, sabe? Esse crescimento do corre em si possibilita muitas coisas e tira um pouco as limitações das ideias e dos projetos que a gente pode fazer.
Tu vem da cena de Fortaleza e segue atuando nesse contexto, além de ter a abrangência nacional que a gente falou agora. Mas qual é a influência dessa tradição do rap cearense na tua música?
Mano, não diria que a maior influência dentro da minha música seja do rap cearense. Mas a maior talvez seja o Don L, eu gosto muito do trabalho dele. Não só pela forma que ele aborda a parte lírica, o conteúdo que ele tá dizendo, mas principalmente a parte sonora, musical. Eu acho ele um produto muito foda, um cara que sabe criar uma sonoridade interessante, entendeu? Então, isso para mim conta muito. É um dos meus rappers favoritos, principalmente da era dele, tá ligado?
Sim, o Don L é incrível. E sobre a aceitação do trap dentro do universo no hip hop: ainda existe uma galera purista que coloca o trap e o funk, vamos dizer, um degrau abaixo do rap?
Vou te falar que nunca nem parei pra pensar nisso. Mano, acho que se pra alguém não adianta o corre que a gente tá fazendo, pra mim sinceramente tanto faz o que os outros pensam a respeito. Pelo menos sobre o meu trabalho. Eu não busco uma aprovação nesse sentido. É muito mais uma parada que tem o objetivo de realmente se conectar com as pessoas que estão interessadas.
Inclusive tu tá preparando um disco novo, que já vem sendo super comentado. Pode falar um pouco sobre isso com a gente? Alguns detalhes sobre o que tu pretende com essa gravação.
Bom, mano, tem um trabalho que tô desenvolvendo agora no estúdio que é o “333”. Eu tô tentando fazer algo que ainda não foi feito, pelo menos por mim. É difícil de explicar, talvez porque não tenha uma referência, algo que eu possa trazer nesse sentido. “Ah, você pode aguardar algo assim ou assado”, entendeu? Realmente tô tentando fazer algo que mostre uma maturidade, uma evolução musical, lírica, enfim. E é um projeto que com certeza para mim vai ser o mais especial. Ainda tô na fase de criação musical mesmo. Então, a gente nem entrou em questões de lançamento, de conceito por trás das músicas, etc e tal. Mas, com certeza, mano, vai ser incrível.
Massa! Com certeza. E falando sobre seu processo de composição, li uma entrevista em que tu fala que não prepara muito as rimas antes de gravar, que pega o microfone, vai improvisando e a melodia e a letra vêm surgindo dessa forma mais espontânea. Fala um pouco mais a respeito disso, por favor.
Bom, eu tô criando, escrevendo músicas, já tem, pô, acho que mais de 15 anos. Eu sempre exploro diversas formas de criar. Por muito tempo, mano, a minha maneira de criar (e continua sendo até hoje, dependendo do intuito, da vibe da sessão de gravação) é como você falou: sentar ali na frente do mic, ouvir o beat, ouvir a música e cuspir as ideias. Vejo o que eu tô sentindo ali na hora e saem coisas muito sinceras dessa forma. É um jeito de me expressar sem filtro, sem ter que pensar duas vezes em algo, sabe?
Mas para esse disco de agora, cada música teve – não vou dizer receita, porque isso não tem – mas uma abordagem diferente, tá ligado? Então teve músicas que eu parei realmente pra escrever, pra pensar nas frases, pra pensar no que eu queria passar. E outras que estão muito mais focadas em passar uma textura sonora, uma estética, uma coisa sonicamente diferente, entendeu? E aí às vezes a musicalidade acaba tomando mais frente do que a lírica. Então, isso varia muito. Acho que principalmente nesse disco, pelo fato de eu ter trabalhado não só faixas de trap ou abordando muito aquilo que eu já costumava fazer, tem muito disso, de novas formas de fazer músicas, novas maneiras de criar. Isso no meu universo de criação, né? Matuê, 30 para um, todo esse rolê.
Inclusive sobre esse lance da lírica e que tu falou agora, existe uma cobrança, que é mais externa do que de dentro do universo do hip hop em si, de que as letras das músicas tragam temáticas sociais e coisas do tipo em detrimento de outros assuntos considerados menos importantes ou fúteis. Como é que tu enxerga isso? Porque acho que tua carreira é atravessada por isso.
Na minha na minha visão, Erick, isso é uma parte essencial do hip hop, do rap, da cultura que a gente participa em geral, mano. E que não pode se perder, entendeu? Minha visão, pelo menos hoje em dia, sobre fazer música, é que o que eu acho interessante de ver na arte ou no artista é a variedade criativa. Às vezes em relação aos temas, mas também nos sons mesmo. O disco pode ser bem diferente entre as faixas, mas ainda assim coeso, tá ligado? Isso é uma parada que eu acho muito massa.
Então, na minha visão não é nada que eu leve de forma pesada. Nenhuma pressão. “Ah, tem que fazer música sobre crítica social”, ou algo do tipo, né? Mas eu acho interessante sempre ter uma linha. E a música em si não precisa abordar somente um assunto. Você tem várias formas de criar, é uma junção de coisas. Então, o que eu acho legal é que tenha riqueza nas palavras da música. Enfim, o conteúdo, sabe?
Massa, massa demais. E ainda sobre as músicas em si: pra construir os beats, tem algum gênero ou outros gêneros musicais nos quais tu busca te inspirar para fazer o teu som?
Nossa, é. Bom, uma grande mudança que rolou com esse disco que vale ressaltar é justamente a parte da produção. Quando comecei o meu corre, eu produzia meus beats. Com o passar do tempo, essa função, como é que eu posso dizer… As pessoas se especializaram né, mano? A rapaziada que resolveu focar em produção e beatmaking, os caras se tornaram muito fodas. E os manos que resolveram focar na voz, na gravação, nas rimas, focaram mais nisso. Então boa parte da minha carreira eu não participei muito da produção das minhas músicas. A produção que eu digo é a produção instrumental, né? Só para deixar isso claro. Toda a parte de composição e criação por trás da parte vocal sempre fiz isso sozinho. Mas, recentemente, eu resolvi estudar de novo sobre produção, porque tava consumindo muita música e afinando um pouco mais o meu ouvido sobre minha nova visão musical. E como eu tava tendo algumas dificuldades também de conseguir esse tipo de som através dos beatmakers que eu já tinha contato, resolvi eu mesmo começar a tirar esse som, entendeu?
Como eu falei, consumo realmente muita música, muitos artistas. Todos os dias tô ali alimentando minhas playlists, consumindo coisas novas, muita coisa underground também, tá ligado? Mas falando de uma galera conhecida, fácil de entender, a visão musical que eu tenha ouvido mais ultimamente, mano, passa muito por Steve Lacy, Frank Ocean, porra, muito Tyler The Creator. Enfim, é uma coisa que ainda tem as suas raízes dentro do hip hop, mas que carrega um lado musical de banda, de elementos orgânicos, que é um lado que eu tô tentando desenvolver. Isso volta para aquela ideia do Don L. Eu acho que isso é uma coisa que ele faz muito bem. Ele sabe misturar a parte musical com a lírica de uma forma muito equilibrada, muito rica mesmo.
Grande parte das tuas músicas, ao menos das mais famosas, tem sempre um super clipe junto, uma super produção audiovisual. Como é que tu vê isso?
Eu tento conectar tudo que tá atrelado com a arte. Até quando é um merch de um lançamento de disco, tudo que tá atrelado à arte, seja clipe, o próprio marketing, o lançamento da obra. Tudo envolve a forma como você traz o interesse das pessoas para esse trabalho. Eu enxergo isso como parte do meu trabalho como artista e gosto de ser criativo dentro de cada uma dessas frentes.
Na parte dos clipes eu me envolvo demais, mano. Adoro escrever roteiros, assisto filmes para caramba. Sou bem tímido em relação a estar em frente a câmera, mas sempre que a gente vai fazer uma produção, tipo “Conexões de Máfia” ou “Quer voar”, alguma coisa assim, eu sempre me preparo muito. A gente deixa tudo prontinho, todos os takes, a forma que a gente visualiza cada coisa, o posicionamento de tudo, a entrega, a expressão. A gente pensa sobre tudo para já deixar bem armadinha ali antes da gravação, mano. E quando o visual fica foda, chama muita atenção também, engrandece a música. Você tem uma conexão visual ali com o artista. Então é da hora.