Fotos: Mariana Carvalho
A fila quilométrica formada na esquina das ruas Bustamante com Providencia, em frente ao esquisito Edifício Telefónica com o formato de um telefone celular antigo, não intimidou os jovens que chegavam aos montes com o objetivo final unânime: o Primavera Fauna 2014. O festival que chegou a sua quarta edição em 2014, trouxe a Santiago, no Chile, bandas que foram grandes destaques nesse ano, como Tame Impala, Icona Pop, The Lumineers e o icônico Omar Souleyman.
O Espacio Brodway, onde aconteceu o Primavera, é um local para shows que reune os maiores eventos de música da cidade. Piscinas, puffs, tendas, mesas de ping-pong e “taca taca” (ou o famoso pebolim) ficavam à disposição do público que preferia frequentar esses espaços ao estar em um dos quatro palcos que dividiam o line up de quase trinta artistas. A abertura de um dos palcos principais foi feita pelos brasileiros do Boogarins, que chegaram até o festival pelo projeto de intercâmbio musical da Semana Internacional de Música de São Paulo (SIM), e participarão do POPLOAD Festival, em São Paulo, no próximo fim de semana.
Uma das coisas mais interessantes é que havia bandas de diversas nacionalidades se apresentando no Primavera Fauna. Os australianos do POND, por exemplo, subiram ao palco às 14h e fizeram com que um pequeno grupo de espectadores aproveitasse o show sem tumulto, com espaço para o psicodelismo do quinteto que tem em sua formação dois ex-integrantes da atração principal do dia, o Tame Impala.
Mas a maior surpresa foi a banda norueguesa Kakkamaddafaka. Com apresentações no Brasil marcadas para o dia 27 de novembro em São Paulo, e dia 29 no Rio de Janeiro, o grupo aposta em músicas divertidas e com influências do rap ao pop, além de ter backing vocals com coreografias fantásticas que dominam o palco e se tornam um espetáculo à parte.
Outro artista que fez com que os chilenos dançassem como se não houvesse o amanhã foi o sírio Omar Souleyman. Ele começou a carreira como músico de casamentos cantando em um estilo folclórico árabe chamado dabke. Misturando essa raiz com o choubi, um outro estilo musical do Oriente Médio, e colocando o toque de Souleyman, Omar conquistou o mundo fazendo com que o Ocidente conhecesse sua música. Com vestimentas típicas e acompanhado apenas de seu tecladista, o músico sírio pôde observar a plateia pegando fogo ao repetir seus gestos, dançando em rodas e tentando cantar, ou entender, as letras das suas músicas.
Quando Tame Impala começou sua apresentação, toda a tranquilidade que esteve presente nos outros shows ficaram para trás e gritos, palmas e assobios dominaram todo ambiente. Meus ouvidos brasileiros não estão acostumados a conseguir ouvir todo o show sem interferências externas, até pela qualidade do som e equipamentos em alguns eventos nacionais, mas, talvez por esse motivo, pude considerar esse um dos melhores shows de todo 2014. Os australianos espalharam a psicodelia de seus dois albuns em um palco com pouca iluminação e um telão ao fundo repleto de cores e movimentos. Antes de tocar o sucesso da banda “Feels like We only Go Backwards” o vocalista Kevin Parker já aguardava uma avalanche de gritos e anunciou que todos poderiam gritar e cantar juntos. Parker conquistou ainda mais a simpatia dos chilenos ao cantar “Apocalypse Dreans” enrolado a uma bandeira que recebeu do público.
O show do Matanza, que ao contrário do que você pode estar pensando não é o grupo do Jimmy London, mas sim uma banda local, fechou esse festival chileno em grande estilo. As raízes indígenas são, ainda, muito fortes no país, e, na música, essa demonstração não fica de fora. O grupo mescla música eletrolatina com folclórica e a combinação tem um resultado maravilhoso. Além de que foi, para mim, uma nova experiência para ouvidos, olhos e alma, com o uso intenso de recursos audiovisuais em projeções no palco e a presença de plantas e incensos em meio à banda.
Voltei para o Brasil levando a lembrança dos shows com a Cordilheira dos Andes ao fundo, do calor infernal da tarde e o frio polar da noite, da gentileza chilena em pedir licença e agradecer por cada passagem nos pontos mais aglomerados, da total falta de gritaria enlouquecida por um “bis” e impressionada com a organização e seriedade desse que tem chances de se tornar um dos maiores festivais do Cone Sul.