Ebony se prepara para a apresentação no Festival Mada, em Natal (RN), no próximo sábado, 19/10. Com flow agressivo e letras explícitas, a artista passeia do trap ao funk e tem se destacado por oxigenar o rap nacional com apelo pop e originalidade. O repertório do show será baseado no segundo disco, Terapia (2023).
Provocadora, Ebony causou no ano passado ao lançar a diss track “Espero que entendam”, na qual questiona o domínio dos homens no mercado do rap e peita artistas como Djonga, Filipe Ret, L7NNON e BK. Mas muito antes disso, a rapper já se destacava na cena hip hop com os trabalhos Condessa (2020) e Visão Periférica (2021).
“Eu gosto da ideia de que estou preparando os ouvidos das próximas gerações para que a música fique mais livre e sem amarras”, declarou em entrevista à NOIZE. Segundo Ebony, o seu maior objetivo é preparar o terreno e inspirar outras meninas negras.
Conversamos com a artista sobre o show no festival Mada e detalhes do terceiro álbum. Confira o papo completo.
Como é construir essas letras e a sonoridade da sua música?
O ponto mais forte do meu último álbum foi provar que o rap também pode ser pop quando feito por mulheres. Nós somos naturalmente divas e ícones. Tem toda a devoção da fanbase, as meninas veem na gente uma representatividade que nos torna pop de uma forma que os homens nunca vão ser. Os nossos shows têm dança, coreografia e espetáculos. Eu busquei fazer músicas alegres, para cima, com muitos elementos da música pop que está bombando, como a da Colômbia. É o caso de “Megalomaníaca”, por exemplo. Essa foi a minha pesquisa, me coloquei como uma diva pop nesse álbum. Acho que essa foi a base da minha sonoridade.
Você está fazendo sucesso dentro de um mercado masculino. Nesse sentido, falar o que você fala é algo contra corrente. Como é ocupar esse espaço?
Cara, gosto muito da ideia de que as minhas músicas e letras não são, sinceramente, felizes. Muitas delas são até problemáticas. Sou uma menina de favela do Rio, rodeada de funk, que é extremamente sujo em termos de linguagem e já foi muito mal visto. Mesmo hoje, com artistas de funk milionários, o funk ainda ocupa um lugar marginalizado. A gente não pode deixar quem marginaliza definir nossa música. Não posso, por medo de que alguém ache obsceno, deixar de falar das minhas referências, de onde eu vim. Então, eu bato o pé e falo da minha origem, da minha forma. Acho que isso cria uma identificação, especialmente com as meninas. Sexo e referências sexuais sempre foram grandes tabus, principalmente para mim, que vim de uma família cristã e religiosa. Tomar o controle sobre essa narrativa é poderoso e acho que isso gera uma grande identificação.
Como você acha que ajuda a oxigenar a cena do rap nacional?
Como artistas, nós não necessariamente inspiramos outros artistas, mas com certeza preparamos os ouvidos do público. Muitos artistas na cena gringa, que são nossa referência, não foram gigantes, mas prepararam o público. Por exemplo, Roxanne Shante, que inspirou Nicki Minaj e Cardi B. Gosto dessa ideia de que estou preparando os ouvidos das próximas gerações para que a música fique mais livre e sem amarras. Uma pessoa que ouviu Terapia não vai achar tão estranho outro álbum sonoramente mais experimental. Gosto de pensar que estou contribuindo com isso.
O Festival Mada tem um line-up com vários gêneros musicais: o que você acha desse movimento do rap entrando mais nesse circuito de festivais?
Considero um movimento natural. Vem junto da demarcação daquilo que é negro. Ponto. O rap já foi marginalizado, o funk também, o samba foi criminalizado, então faz sentido que esses ritmos tomem o seu espaço. Para mim, a música popular brasileira é funk, é pagodão baiano, são os sons nordestinos. Essa ideia de que música popular brasileira é só uma bossa nova embranquecida da zona sul do Rio é muito elitista e genérica. Então, ver ritmos populares brasileiros nos festivais é algo que deveria ter acontecido antes.
O que você vislumbra para a sua carreira daqui para frente? Quais são os próximos passos?
Quero fazer movimentos pontuais com minha carreira e música. Para mim, a arte vai além de entrar no estúdio, tem um significado artístico maior. Não sou do tipo que lança muita música. Ano que vem vai ter álbum novo, mas sempre no meu tempo, do meu jeito. Quero continuar assim, sem me apressar, só fazendo música, conectando com pessoas e inspirando meninas negras. Isso é importante para mim.
O que você pode adiantar desse álbum novo?
Estou com todas as faixas prontas e está muito quente, mas é bem diferente. Algumas músicas são tão diferentes, que até eu estranhei. Gosto de desafiar o meu ouvido, de estudar música e questionar. Vou fazer isso com mais afinco no próximo álbum, mas sempre respeitando o meu tempo.
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